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Escritório em casa: a vez do teletrabalho

Escritório em casa: a vez do teletrabalho

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Quando as restrições em razão da pandemia começaram, em março de 2020, a Euro Condomínios, que administra 100 mil unidades habitacionais, preparava-se para aplicar um sistema em nuvem para que os seis escritórios, que ficam em cidades distintas, tivessem acesso. A medida foi acelerada e facilitou a adaptação da empresa, em fase de expansão, para o teletrabalho. 
Mesmo antes das restrições, a Euro havia adotado o trabalho em casa para 95% dos colaboradores. Hoje 70% permanecem neste modelo e 50% devem continuar, mesmo após a pandemia. “Em 16 de março, antes do primeiro decreto municipal restritivo, quando começamos a ver movimentações de alguns casos, mandamos quase todo mundo para casa. De 55 funcionários, 50 foram trabalhar em casa”, diz o diretor administrativo, Marcelo Liberati. 
A semana seguinte foi de ‘correria’ para equipar os colaboradores. E, por causa dos custos extras, por exemplo com energia elétrica, a Euro oferece verba de representação para os trabalhadores que estão prestando os serviços de casa. “Levamos o escritório para dentro da casa de cada um, para que não fossem perdidos o conforto e a tranquilidade que oferecíamos na empresa. Mandamos móveis, cadeiras e outros recursos. O maior desafio foi a solicitação de aumento da banda larga para alguns colaboradores, mas em dois dias estava tudo organizado”, conta Liberati. 
Graças ao sistema implantado com a expansão, é possível acompanhar a produtividade, processos e procedimentos. O diretor diz que foram implementadas premiações mensais por alcance de objetivos. “Tínhamos dificuldade grande para atingir 100% de produtividade. Respeitamos a rotina dos colaboradores e hoje chegamos com todo mundo comemorando dois, três dias antes todas as tarefas finalizadas”, comemora.
A empresa se cercou de recursos para promover o bem-estar dos funcionários, o que acabou refletindo na produtividade. Com quatro meses de pandemia, um atendimento especializado de psicologia foi contratado para ajudar as pessoas a enfrentar os desafios do momento e do ambiente doméstico.

Marcelo Liberati, da Euro Condomínios: 70% dos colaboradores estão trabalhando em casa e ganharam móveis, cadeiras e verba de representação

Atenção aos protocolos

Na Solarium Mobília, a preocupação é promover o desenvolvimento dos funcionários seguindo os protocolos orientados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e Ministério da Saúde. Segundo o proprietário João Victor Leite, os setores que não são indispensáveis para a produção na fábrica passaram a operar de casa. 

Com as primeiras restrições para conter a disseminação do coronavírus, a empresa concedeu férias coletivas. No retorno, todos passaram a trabalhar meio período. Só depois o teletrabalho foi adotado.

Ao todo são 25 funcionários, sendo sete admitidos após a pandemia – há plano para expansão até o final do ano, com previsão de 20 novas contratações. A maioria trabalha diretamente na fabricação dos produtos, por isso continua atuando dentro da empresa, mas respeitando as regras de distanciamento. 

Principalmente os colaboradores do setor de vendas têm trabalhado de casa. “A função é parecida com o telemarketing. A equipe entra em contato oferecendo o nosso serviço. Como ainda necessitamos de atendimento na loja, revezamos as funcionárias”, explica o empresário. 

O trabalho de casa é possível graças ao sistema na nuvem. As colaboradoras foram equipadas com computador e celular disponibilizados pela empresa. A cada semana são repassadas metas e todos se comunicam por grupos criados no WhatsApp. Segundo o empresário, não houve prejuízos na produtividade. “O sistema pode ser acessado de qualquer lugar. Ele permite acompanhar as entregas dos colaboradores”, pontua Leite.

Na Solarium Mobília, de João Victor Leite, colaboradores foram equipados com computador e celular e as equipes se comunicam por grupos de WhatsApp

Regras

De acordo com a cartilha Teletrabalho, material educativo produzido pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), o teletrabalho é realizado fora das dependências do empregador, com uso de recursos tecnológicos que não se enquadram na ideia de trabalho externo, a exemplo de motoristas e vendedores externos. Ainda de acordo com o material, a modalidade inclui o trabalho realizado em casa, em telecentros, em cafés, coworking, entre outros – o home office é um termo específico para o trabalho realizado em casa, abrangendo também autônomos e freelancers, portanto não coberto pela regulamentação. 

O advogado Diego Marchiotti explica que o teletrabalho foi devidamente regulamentado com a Reforma Trabalhista – Lei № 13.467/2017. “Além de possibilitar melhor enfrentamento deste estado de calamidade de saúde pública, a ferramenta favoreceu significativamente a manutenção dos empregos, a circulação de riquezas, bem como recolhimento de impostos”, diz.

O regime precisa constar no contrato de trabalho. Excepcionalmente na pandemia, os empregadores podem implementar a modalidade independentemente de acordos individuais e coletivos, conforme a Medida Provisória 927, dispensado o registro prévio da alteração no contrato. Marchiotti orienta, no entanto, que empresas e trabalhadores estabeleçam todas as condições em contrato. 

Uma característica dessa modalidade, por exemplo, é que o empregado pode realizar as atividades para as quais foi contratado a seu critério, já que o teletrabalho não admite controle de jornada. Isso, entretanto, não desobriga o trabalhador de prestar contas dos serviços ao empregador. Para preservar a boa relação contratual e evitar conflitos, devem constar em termo todos os detalhes da relação de trabalho, como as atividades executadas pelo empregado e a responsabilização pelas aquisições, manutenções, fornecimentos e reembolsos dos equipamentos tecnológicos e a estrutura necessária e adequada para a realização dos serviços.

O advogado ressalta que os direitos para os empregados em teletrabalho são os mesmos do regime presencial, exceto os direitos decorrentes da jornada de trabalho presencial (horas extras, adicional noturno, sobreaviso etc).

O advogado Diego Marchiotti sugere que empresas e trabalhadores estabeleçam em contrato todas as condições do teletrabalho, que não pode ter controle de jornada

Recursos

Sobre a infraestrutura de trabalho, segundo a advogada Cristianne Ganem Kisner, a aquisição, manutenção, fornecimento de equipamentos e  outros recursos necessários ou adequados para o teletrabalho continuam a ser do empregador. Ela explica que caso o empregado utilize apenas ferramentas e equipamentos que mantém em casa para fins particulares, a empresa não tem necessariamente que arcar com esse custo, desde que não demande gastos ou custos adicionais. “Se o teletrabalho demandar despesas extraordinárias, como a aquisição de computador ou software específico e aumento da rede de internet, esses custos adicionais devem ser suportados pelo empregador”, pondera.

De modo geral, Cristianne orienta as empresas a ter em conta que o teletrabalho não significa apenas enviar o empregado para exercer a função em home office. A decisão deve ser pensada de acordo com a finalidade e a necessidade de cada setor ou segmento.

Ela destaca que o controle do início e término da jornada, exigindo logins ou outra forma de acesso à rede do empregador em determinados horários, descaracteriza o regime de teletrabalho. 

Os contratos, destaca a advogada, devem ser bem elaborados, contendo o máximo de informações a fim de que não restem dúvidas sobre as obrigações e responsabilidades de cada um. Ela frisa que, para isso, a participação do setor de recursos humanos é fundamental, já que mesmo no teletrabalho devem ser observados os cuidados para manter o ambiente em condições ergonômicas adequadas, para doenças ocupacionais ou mesmo acidentes de trabalho. “Esclarecer sobre os riscos ergonômicos, a necessidade de utilização de ferramentas e equipamentos adequados, a fim de criar um ambiente de trabalho saudável, é essencial.”

Cristianne Ganem Kisner, advogada: “se o teletrabalho demandar despesas extraordinárias, esses custos adicionais devem ser suportados pelo empregador”

Recomendações

- Respeitar a ética digital, preservando o espaço do trabalhador de autonomia, intimidade, privacidade e segurança pessoal 

- Regular a prestação de serviços em teletrabalho, ainda que durante a pandemia de Covid-19, por meio de contrato de trabalho aditivo por escrito, com adaptação e treinamento mínimo 

- Observar os parâmetros de ergonomia, as condições de organização do trabalho e as relações interpessoais 

- Garantir ao trabalhador o direito a pausas e intervalos para descanso, repouso, alimentação etc 

- Oferecer apoio tecnológico, orientação técnica e capacitação para a realização de trabalho em forma remota e em plataformas virtuais;

- Instruir os empregados quanto a precauções para evitar doenças, físicas e mentais, e acidentes de trabalho 

- Assegurar que o uso de imagem e voz seja precedido de consentimento expresso dos empregados, principalmente em atividades que serão difundidas em plataformas digitais abertas 

- Estimular a criação de programas de profissionalização especializada para a mão de obra dispensada.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho