Depois de regressar de uma viagem para os Estados Unidos, Larissa Milani abriu a Wordfy para ministrar inglês para negócios; com a expansão, a empresa vai ser desenquadrada do MEI
Foi durante uma temporada nos Estados Unidos, em 2017, que Larissa Milani descobriu a veia empreendedora. Formada em Secretariado Executivo Trilíngue pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), ela havia se mudado para Nova Iorque para aprimorar o inglês e lá se ‘reencontrou’ com o Business, área que havia deixado para trás após experiências frustrantes.
“Logo que me formei trabalhei como secretária-executiva, entretanto me frustrei. Então, por necessidade financeira, fui para sala de aula ensinar inglês e acabei me apaixonando pela profissão. Lecionava em escolas, porém sentia que precisava estudar mais, fazer mestrado e doutorado e aí decidi passar um ano fora”.
Na bagagem de ida, Larissa levou a vontade de aprender. Na volta, trouxe conhecimento, cinco quilos de apostilas e um plano de negócio. Nascia ali a Wordfy - Inglês para Negócios. Para formalizar a empresa, ela buscou ajuda na UEM. “Fui até a universidade e um professor do curso de Contabilidade me ajudou a abrir o MEI. Queria trabalhar com tudo certinho, mas na época também estava de olho nos benefícios assegurados ao microempreendedor individual”, conta.
A Wordfy começou ofertando aulas personalizadas presenciais. Larissa ia aos endereços indicados pelos alunos e focava a aula nas necessidades de cada um. “Uns queriam se preparar para uma entrevista de emprego, outros para uma prova ou uma viagem”.
Em 2019, a demanda cresceu a ponto de impossibilitar o atendimento presencial e, após uma reestruturação do modelo de negócio, a Wordfy migrou para o online. Essa mudança ocorreu com auxílio de consultorias, inclusive do programa Empreender da ACIM. “Quando a pandemia começou, em 2020, já estávamos no online e isso permitiu chegar rapidamente a outros estados, como São Paulo e Santa Catarina, e até a outros países”, conta Larissa, que havia desenvolvido uma metodologia própria de ensino.
No ano passado, ela contratou nova consultoria, desta vez para ajudar a tirar do papel o Wordfy Club que disponibiliza, em uma plataforma digital, mais de 70 aulas gravadas com materiais em pdf e exercícios. “É uma espécie de assinatura de streaming em que o usuário adquire e consome o conteúdo disponibilizado na plataforma. É um produto escalável, que foi testado por três meses, validado e está sendo aprimorado”.
Com a nova ferramenta, Larissa projeta a expansão do negócio e faturamento superior aos R$ 81 mil anuais permitidos ao microempreendedor individual, bem como a necessidade de reforçar a equipe para fazer o atendimento e o marketing. Por isso, já prepara o processo de desenquadramento como microempreendedora individual. “O MEI serviu como uma porta de entrada por conta dos baixos custos. Mas, felizmente, a Wordfy cresceu e vamos ter que migrar para outro modelo, até porque a ideia é continuar expandindo”.
Empreendedor em tempo integral
Para complementar a renda, Valério Rosa fazia trabalhos de cinegrafista como freelancer; com o aumento dos serviços, ele deixou o trabalho numa emissora de TV para se dedicar integralmente ao negócio
Quem também espera chegar nesse patamar é Valério Cristiano Pereira Rosa. O trabalho freelancer surgiu como renda extra, mas abriu as portas para uma guinada profissional. Trabalhando em uma emissora de TV de Maringá, ele aproveitava o horário livre para fazer ‘bicos’ de gravação e edição de vídeos. Em 2019, formalizou-se como microempreendedor individual para emitir nota fiscal. “Muitos clientes pediam nota e o MEI foi a melhor solução porque era fácil abrir e os custos são baixos”.
A partir daí, viu a demanda pelos serviços aumentar inviabilizando a conciliação das duas atividades. E na hora de escolher, não teve dúvidas: deixou o emprego com carteira assinada e abraçou de vez o empreendedorismo. “Comecei a perder clientes por causa do horário fixo de trabalho na TV e decidi sair”, conta o agora microempreendedor individual em tempo integral.
A mudança, segundo o editor de vídeos filmmaker, era planejada e foi impulsionada pela abertura do MEI, tanto que ele não se importou com a perda de benefícios assistenciais imposta pela formalização. “Estava ciente que perderia direitos como o seguro-desemprego, mas como planejava sair espontaneamente da TV, como aconteceu, isso não foi problema”.
A produtora de Rosa, batizada de VP Áudio e Vídeo, ganhou projeção e, consequentemente, clientes. Os vídeos comerciais são o carro-chefe, mas a procura por produções institucionais e para redes sociais vem crescendo.
Na condição de MEI, o editor de vídeos também teve a oportunidade de participar de capacitações e treinamentos, inclusive disponibilizados pelo Núcleo de Marketing do Empreender. E embora ainda não tenha recorrido a financiamentos e linhas de crédito, ele sabe que se precisar de recursos para investir na produtora, terá acesso a condições diferenciadas como microempreendedor individual.
Por enquanto, ele segue trabalhando sozinho em home office, entretanto tem planos de ter espaço físico próprio para a produtora e ampliar as parcerias com empreendedores. “Quero expandir. É uma caminhada longa, o MEI é só o início”, afirma.
Fim da consignação
Depois de uma consultoria, Janaína Zamboni dos Santos, dos Chinelos Lá & Cá, decidiu abandonar as vendas por consignação e apostar em parcerias com os pontos de vendas; ela também faz planos de ter e-commerce
Das 19,3 milhões de empresas ativas no Brasil, 13,4 milhões são MEI, segundo o Ministério da Economia. Isso representa quase 70% dos negócios ativos. E foi esse o caminho de Janaína Zamboni dos Santos, que traça planos ousados para os Chinelos Lá & Cá, empresa que adquiriu em 2017, ano em que se lançou como microempreendedora individual. Até o final do ano ela planeja dobrar os pontos de vendas físicos e lançar o e-commerce. A longo prazo, não descarta a possibilidade de uma franquia. “É um sonho, mas preciso fazer cursos e entender esse modelo de negócio”, diz.
Até lá, a ideia é fortalecer a marca, abrir mercados e celebrar parcerias. Para isso, Janaína sabe que precisa intensificar a estratégia adotada desde o ano passado, quando passou a percorrer cidades da região e mudou a forma de comercializar a produção dos Chinelos Lá & Cá.
“Vendia por consignação, ou seja, deixava os chinelos para que os vendedores os colocassem no expositor e oferecessem para seus públicos. Descobri que não era o melhor jeito depois de fazer uma consultoria no Sebrae. A consignação é para quem tem bom capital de giro e só funciona para divulgar a marca no início. São necessários vendedores e lojistas que se esforcem para vender o produto, o que não acontece com o produto consignado”, explica.
Para negociar e fechar as parcerias, ela resgatou os conhecimentos do período em que trabalhou no comércio, com carteira assinada, como vendedora. Também recorreu aos ensinamentos da mãe comerciante e investiu em cursos e consultorias. Atualmente, a marca conta com 15 pontos de vendas físicos em dez cidades das regiões de Maringá e Londrina.
Não menos desafiador foi o processo de aprendizagem de fabricação manual dos chinelos terapêuticos, para a saúde dos pés e alívio de dores. Hoje ela domina a técnica e, trabalhando sozinha nos fundos de casa na Vila Morangueira, consegue produzir entre 80 e 100 pares por dia. “No inverno aproveito para abastecer o estoque, porque é um trabalho 100% manual e sou exigente com a qualidade do produto”.
A exigência só não supera a confiança no sucesso do negócio. Chefe de família e formada em Serviço Social, Janaína se diz realizada com a carreira e recomenda o caminho do empreendedorismo para quem sonha com a independência financeira. “Minha filha Carolina, de 18 anos, fez curso de design de sobrancelha e já abriu o MEI. O custo por mês é acessível, não tem burocracia, tem benefícios e facilidades para crescer”, conclui.
Modalidade em alta
Luciano do Marco Campos, consultor do Sebrae: “com o desemprego, surgem os empreendedores por necessidade. Mas tem o empreendedorismo por oportunidade. Por exemplo, aumentaram as possibilidades de negócios online”
Não à toa o Brasil ganhou quase 6 milhões de microempreendedores individuais desde 2020 – 646 mil só neste ano. O Paraná tem 865 mil microempreendedores individuais, sendo que mais de 38,3 mil estão em Maringá.
“Ano após ano, aumenta o número de empresas registradas. Segundo pesquisas do Sebrae, com base em dados da Receita Federal, em 2021 foram mais de 3,9 milhões de empreendedores que se formalizaram em busca de uma fonte de renda ou para realizar o sonho do negócio próprio. Esse número representa incremento de 19,8% em relação a 2020, quando foram criados 3,3 milhões de CNPJs”, diz o consultor do Sebrae Paraná, Luciano do Marco Campos.
Embora reconheça a relação desse aumento com o alto índice de desemprego e a reforma trabalhista, o consultor enaltece a possibilidade de abrir negócios e prosperar. “Com o desemprego, surgem os empreendedores por necessidade. A reforma também impactou as terceirizações de trabalho. Mas, além disso, tem o empreendedorismo por oportunidade. Por exemplo, aumentaram as possibilidades de negócios online”.
Por necessidade ou oportunidade, é inegável que a figura do MEI abre caminho para quem quer alcançar a independência no trabalho, aumentar a renda mensal ou aceitar o desafio de um negócio autônomo devido à falta de melhores alternativas profissionais. Uma vez dado o pontapé é importante conhecer as necessidades para entender o momento certo de mudar, adaptar-se e aproveitar uma oportunidade inesperada. E é por isso que o programa vai além do processo de formalização.
“O MEI tem acesso a apoio técnico do Sebrae com soluções como consultorias na área de gestão do negócio, palestras e oficinas, em sua maioria gratuitas”, destaca Campos. O amparo se estende à ampliação e garantia de acesso ao crédito, seja por meio de parcerias ou criação de fundo garantidores e negociação de dívidas. “Muitos MEIs tiveram dificuldade para arcar com as contribuições por causa da pandemia. Em 2021, no mês de maio houve a maior taxa de inadimplência, segundo a Receita Federal: 65,7% dos 12,4 milhões atrasaram o imposto naquele mês. O governo propôs facilidades para o pagamento das taxas e regularização, já que a inadimplência faz com que o MEI perca os direitos”, alerta o consultor.
Futuro com aposentadoria
Quando a figura do MEI foi criada em 2008, por meio da Lei Complementar nº128, a intenção do governo federal não era incentivo ao empreendedorismo, mas o combate à informalidade. “O objetivo era formalizar trabalhadores autônomos”, explica Campos.
São profissionais como Maria Inês Soares da Rocha Piasentim, que há quase 20 anos trabalha como feirante em Maringá. Desde 2003 ela frequenta feiras livres da cidade e sua renda vem do food truck Blitz Churros & Crepes. Entretanto, até 2010, a feirante trabalhava sem amparo legal ou segurança jurídica. Essa situação mudou com a abertura do MEI. “É muito bom ter a segurança de uma aposentadoria no futuro”.
Além do benefício previdenciário, Maria Inês teve outro ‘incentivo’ para buscar a formalização: a permissão para emissão de nota fiscal. Isso porque além das feiras livres noturnas – realizadas durante a semana em quatro locais de Maringá – ela presta serviços em eventos. “Para os eventos os clientes querem nota, principalmente quando são empresas”, explica.
Os crepes e os churros fazem sucesso. São dela as receitas e a produção das massas e de cinco das sete opções de recheios. “Só os doces de Nutella compro no mercado e os morangos na Ceasa”.
Em média, são vendidos 120 churros e 80 crepes por dia, sendo o primeiro ao custo de R$ 8 e o segundo por R$ 9 - o crepe especial pode chegar a R$ 15. Para dar conta dos pedidos, Maria Inês conta com a ajuda do marido, Gilberto Brasílio Ventaja Piasentim. Ele, aliás, foi quem a incentivou a se tornar MEI e ‘emprestou’ o contador da sua empresa para auxiliá-la no processo de formalização.
Satisfeita com as vendas, a feirante faz planos de pequenos investimentos para garantir a manutenção do negócio, que espera deixar de ‘herança’. “Meus filhos estão casados, têm suas vidas, mas acredito que é algo que eles podem dar continuidade”, finaliza.
Serviços, consultorias e capacitação
Embora o processo de formalização possa ser feito online no Portal do Empreendedor, quem precisar de orientação pode procurar ajuda no Espaço do Empreendedor - antiga Sala do Empreendedor. O espaço reúne os recursos para abrir, manter regularizado e desenvolver o negócio do microempreendedor individual.
“Oferecemos serviços de formalização, alteração de dados, impressão do boleto DAS, declaração anual de faturamento, orientação e acesso ao crédito”, cita a diretora do espaço, Cássia Mendonça.
Lá, o microempreendedor também pode buscar consultorias e capacitações ofertadas por meio de parcerias com o Sebrae e instituições de ensino. Em média, são realizados entre 70 e 80 atendimentos diários, que passaram a ser agendados após a pandemia. O agendamento é feito por meio da sala digital, no site da prefeitura de Maringá, ou no site da Flugo.
O Espaço do Empreendedor fica na rua Arthur Thomaz, 792, e funciona das 8h às 11h30 e das 13h às 17h30.